Um acordo de tramitação permitiu que a PEC do
Trabalho Escravo fosse aprovada nesta quinta-feira (27) pela Comissão de
Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. A proposta, que permite a
expropriação de terras onde houver exploração de trabalhadores, ainda passará
por votação no Plenário da Casa.
O
acordo prevê a criação de uma comissão de deputados e senadores para analisar
dois projetos: um para definir o que é trabalho escravo e outro para
regulamentar os processos de desapropriação.
Sem
alteração
O
relator da matéria, senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), ressaltou que
essas medidas são necessárias para que a PEC tenha chances de ser aprovada no
Plenário do Senado sem ser alterada - ou seja, mantendo o texto aprovado no ano
passado pela Câmara dos Deputados. Se houver mudanças, a proposta terá de
retornar à Câmara, onde enfrentou a resistência dos parlamentares vinculados ao
agronegócio e só foi aprovada depois de 11 anos de tramitação.
Segundo
Aloysio Nunes, o acordo pode diminuir a resistência de quem afirma que, sem uma
regulamentação, a PEC permitirá expropriações arbitrárias - que poderiam
acontecer, por exemplo, mediante um simples ato administrativo de fiscais do
trabalho ou de membros do Ministério Público do Trabalho.
O
senador Blairo Maggi (PR-MT) está entre os que apontam esse risco. Maggi disse
que ninguém em sã consciência apoia o trabalho escravo, mas também afirmou que,
da forma como está, a PEC vai criar uma conflagração no campo.
A
comissão mista terá cerca de um mês para oferecer uma definição do que é
trabalho escravo e uma regulamentação. Aloysio Nunes explicou que, pelo acordo,
tanto essas definições como a própria PEC podem ser votadas ao mesmo tempo no
Plenário do Senado.
O
presidente da CCJ, senador Vital do Rêgo (PMDB-PR), informou que a comissão
poderá ser criada já na próxima semana.
Regulamentação
Blairo
Maggi assinalou que existe uma discussão muito grande, no âmbito da legislação,
sobre o que é efetivamente trabalho escravo ou análogo ao trabalho escravo. Na
opinião do senador, existe uma linha muito tênue entre as duas ações.
“Dependendo do fiscal que vai à sua propriedade, ele pode enquadrar ou não o
produtor”, pontuou.
Ao
apontar essas dificuldades, Maggi, que é produtor rural, citou a norma
regulamentadora NR-31, muito criticada por representantes do agronegócio. “A
NR-31 diz que a porta do alojamento tem que abrir para fora, mas ela abre para
dentro”, exemplificou.
Aloysio
tem dito que os receios quanto à arbitrariedade na aplicação da PEC não têm fundamento,
pois, segundo ele, não pode haver expropriação sem um processo legal e este,
por sua vez, pressupõe a existência de uma regulamentação definida em lei. “A
PEC do Trabalho Escravo precisará de uma lei que diga como as expropriações
serão feitas. A nova redação que a PEC dá ao artigo 243 da Constituição não é
autoaplicável”, reiterou.
Maggi
argumentou que não se sabe como promotores e o Ministério Público do Trabalho
vão se portar se a PEC for aprovada sem uma regulamentação. Maggi chegou a
fazer um apelo para que a proposta não fosse aprovada pela CCJ nesta
quinta-feira e, assim, houvesse mais discussões.
Foi
por essa razão que Aloysio propôs a criação da comissão mista que trabalhasse
paralelamente à tramitação da PEC. O relator explicou que fez essa sugestão
“diante de tantas reservas externadas pelos líderes dos partidos representados
na Câmara e que, muito provavelmente, encontrarão eco no Senado”. Mesmo o
senador Pedro Taques (PDT-MT), outro defensor da PEC, afirmou que a
regulamentação é necessária para evitar insegurança jurídica.
Expropriação
A PEC
do Trabalho Escravo, que altera o artigo 243 da Constituição, determina que as
propriedades rurais e urbanas onde forem descobertas a exploração de trabalho
escravo serão expropriadas e destinadas à reforma agrária ou a programas de
habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário.
Também
determina a mesma punição se forem descobertas culturas ilegais de plantas
psicotrópicas. Em seu parecer, Aloysio Nunes ressalta que, “em diversos
municípios, principalmente das regiões Norte e Nordeste, onde se situa grande
área de cultivo de plantas psicotrópicas, milhares de jovens e trabalhadores
rurais são arregimentados [inclusive por meio de sequestro] por quadrilhas do
tráfico de drogas para trabalharem mais de dez horas por dia, em seis meses do
ano, nessas plantações”.
Além
disso, a proposta prevê que os bens de valor econômico apreendidos por causa da
exploração de trabalho escravo serão confiscados e revertidos para um fundo
especial.
Prática
comum
Ao
assinalar a importância da PEC, Aloysio Nunes destacou a estimativa do
Ministério Público do Trabalho de que cerca de 20 mil pessoas vivem em
condições equivalentes à escravidão no Brasil. Também menciona a informação do
Ministério do Trabalho e Emprego de que, desde 1995, mais de 45 mil pessoas
foram resgatadas dessas condições pelo governo. Ele concluiu que, “apesar dos
esforços no combate a toda forma de trabalho análogo à de escravo, os números
revelam que essa prática ainda é muito comum no País”.
O
senador lembrou que o trabalho escravo não acontece somente na zona rural, mas
também em áreas urbanas. Como exemplo, ele cita os casos de imigrantes
sul-americanos que trabalham em condições insalubres e sem proteções
trabalhistas em confecções na cidade de São Paulo ou os de asiáticos em
condições semelhantes que trabalham com o comércio de produtos provenientes da
China.
Aloysio
Nunes observou que “são poucos os casos de condenação criminal da Justiça de
pessoas que submetem outras à escravidão”. Por isso, argumentou, a aprovação
dessa PEC “deverá ajudar o combate à impunidade que, juntamente com a ganância
e a pobreza, alimentam a prática do trabalho escravo no Brasil”.
Fonte:
Câmara dos Deputados Federais
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