O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), na sessão desta quinta-feira (28), julgou parcialmente procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1842, ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) para questionar normas do estado do Rio de Janeiro que tratam da criação da região metropolitana do Rio de Janeiro e da microrregião dos Lagos e disciplinam a administração de serviços públicos.
O ponto central discutido nos autos é a legitimidade das
disposições normativas ao instituir região metropolitana do Rio de Janeiro e a
microrregião dos Lagos (Lei Complementar 87/89) transferindo do âmbito
municipal para o âmbito estadual competências administrativas e normativas
próprias dos municípios, que dizem respeito aos serviços de saneamento básico
(Lei estadual 2.869/97).
Os ministros Gilmar Mendes, Nelson Jobim (aposentado),
Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Teori Zavascki e Rosa Weber
manifestaram-se pela procedência parcial da ação direta, vencido parcialmente o
ministro Marco Aurélio - que julgava procedente em menor extensão - e o relator
da ação, ministro Maurício Corrêa (falecido), que julgava a ADI totalmente
improcedente.
O ministro Luiz Fux pediu vista quanto à questão da
modulação dos efeitos da decisão. A maioria dos ministros votou pela modulação
da decisão a fim de que seus efeitos passem a valer 24 meses depois do
julgamento da ADI, para que os municípios possam se adequar à solução. O
ministro Marco Aurélio votou contrariamente à modulação.
Voto-vista
O ministro Ricardo Lewandowski apresentou seu voto-vista
durante o julgamento de hoje (28). Ele votou pela procedência parcial da ação
direta, ao entender que a gestão deve ser compartilhada. “A gestão regional
compartilhada não significa, como observou o ministro Gilmar Mendes em seu
voto, que o poder decisório tem que ser necessariamente partilhado de forma
igualitária entre os municípios, o município polo e o estado instituidor”,
disse, concordando com a ideia de que a participação dos municípios deve ser
proporcional ao seu peso específico do ponto de vista político, econômico,
social e orçamentário.
De acordo com o ministro, no caso, deve haver um
consenso na medida em que nem o estado nem o conjunto dos municípios podem ter
a última palavra. “Para a efetivação dos valores constitucionais em jogo, basta
que nenhum dos integrantes do ente regional seja excluído dos processos
decisórios que nele ocorram ou que possa sozinho definir os rumos da gestão
destes. Também não me parece aceitar do ponto de vista constitucional que a
vontade do conjunto dos municípios prevaleça sobre a do estado instituidor do
ente regional ou vice-versa”, salientou.
Na mesma linha dos votos proferidos pelos ministros
Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, o ministro Ricardo Lewandowski entendeu que a constitucionalidade
dos modelos de gestão das entidades regionais, previsto no artigo 25, parágrafo
3º, da Constituição Federal “está condicionada ao compartilhamento do poder
decisório entre o estado instituidor e os municípios que os integram, sem que se
exijam uma participação paritária relativamente a qualquer um deles”.
Lewandowski acrescentou que, além da gestão
compartilhada, a participação das entidades civis é importante. “Não me parece
haver nenhum problema em delegar a execução das funções públicas de interesse
comum a uma autarquia territorial, intergovernamental e plurifuncional, desde
que a lei complementar instituidora da entidade regional lhe confira
personalidade jurídica própria, bem como o poder concedente quanto ao serviço
de interesse comum”, avaliou.
Modulação
O ministro Lewandowski modulou os efeitos da declaração
de inconstitucionalidade para que ela só tenha eficácia a partir de 24 meses
após este julgamento. “Entendo que se cuida de uma decisão que envolve a
prestação de serviços públicos relevantes da região metropolitana do Rio de
Janeiro, da microrregião dos Lagos, os quais não podem sofrer dissolução de
continuidade”, completou.
Ministro Teori Zavascki
Em seu voto, o ministro Teori Zavascki afirmou que a
constituição das regiões metropolitanas não pode ocorrer por mera transferência
de atribuições para os estados, pois isso comprometeria o núcleo central do
federalismo, e proferiu voto pela procedência da ação de inconstitucionalidade.
O ministro realçou que se abstém em seu voto de traçar uma fórmula precisa para
a participação dos diversos entes em uma entidade comum: “Independentemente do
critério, que deve ficar em grande medida reservada ao legislador estadual, é
certo que não pode se constituir pura e simples transferência para o
estado-membro, o que é suficiente para um juízo de procedência da ADI”, afirmou
Teori Zavascki.
Ministra Rosa Weber
A ministra Rosa Weber seguiu a mesma linha da
divergência aberta por Gilmar Mendes, apontando a inconstitucionalidade das
leis fluminenses no que toca as atribuições do poder estadual. “Nos votos há
convergência para que se preserve a autonomia municipal. De fato há necessidade
de assegurar a participação do estado e dos municípios envolvidos, não
necessariamente a paridade. Mas não é necessário que formatemos essa
participação” afirmou.
Ministro Marco Aurélio
O ministro Marco Aurélio observou em seu voto que a
região metropolitana trata de funções e serviços públicos de interesse comum,
mas o debate está centrado no saneamento básico. O serviço, observa o ministro,
configura-se em um monopólio natural - em específico o fornecimento de água e
esgoto - uma vez que seu fornecimento por uma única empresa terá
necessariamente um custo menor do que com o fornecimento por diversos grupos
concorrentes.
Ainda que reconheça a pertinência da criação das regiões
metropolitanas para a gestão dos serviços públicos compartilhados, o ministro
ressaltou em seu voto que o artigo 25 da Constituição Federal, que trata dessa
hipótese, “não representa autorização para que o estado avoque competências
locais à sua livre escolha”. A submissão das decisões da administração
metropolitana ao referendo dos órgãos estaduais - o governador e a Assembleia
Legislativa - implicaria, para o ministro, um desequilíbrio federativo, implicando
a inconstitucionalidade dessas regras.
Resultado
Com o final do julgamento quanto ao mérito da matéria, o
Plenário julgou parcialmente procedente a ADI para declarar a
inconstitucionalidade da expressão “a ser submetido à Assembleia Legislativa”
constante no inciso I do artigo 5º; a inconstitucionalidade do artigo 4º do
parágrafo 1º do artigo 5º; dos incisos I, II, IV e V do artigo 6º; do artigo
7º; artigo 10; e do parágrafo 2º do artigo 11 da Lei Complementar 87 de 1997 do
Estado do Rio de Janeiro; e dos artigos 11
a 21 da Lei
2.869 de 1997. Ficou registrado o pedido de vista do ministro Luiz Fux quanto à
questão da modulação.
As Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 1826,
1843 e 1906 também foram analisadas em conjunto com a ADI 1842 na sessão de
hoje, em razão da existência de conexão entre os temas tratados nesses
processos.
Fonte: Supremo Tribunal Federal
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