A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ), em decisão inédita, entendeu que o Regulamento do ICMS do Estado do Rio
Grande do Sul não pode exigir que a compensação dos créditos do imposto, em
operações com produtos agropecuários, ocorra com débitos fiscais decorrentes de
operação de mercadoria da mesma espécie da que originou o respectivo não
estorno, sob pena de violar a Lei Complementar 87/96. A decisão, unânime,
acompanhou o voto do relator, ministro Mauro Campbell Marques.
O recurso julgado foi apresentado pela empresa Fasolo
Artefatos de Couro Ltda. Ela adquiriu unidade filial da empresa Defer S/A,
obtendo, em virtude dessa operação, a transferência de créditos acumulados de
ICMS, que, posteriormente, foram utilizados para fins de compensação.
O fisco estadual autuou a empresa, com base no
artigo 37, parágrafo 8º, do Decreto Estadual 37.699/97 (RICMS), pois os
créditos acumulados pela Defer decorreram da venda de adubos e fertilizantes
sob o regime de isenção e os débitos (compensados) referem-se a operações com
artefatos de couro.
Créditos do não estorno
O ministro Mauro Campbell Marques explicou que o
artigo 155, parágrafo 2º, inciso II, da Constituição Federal impõe que a
isenção ou não incidência não implicará crédito para compensação com o montante
devido nas operações ou prestações seguintes; e acarretará a anulação do
crédito relativo às operações anteriores.
Segundo ele, a Constituição, em regra, impõe a
anulação (estorno) dos créditos de ICMS, ressalvando a existência de
determinação em contrário da legislação (artigo 155, parágrafo 2º). A Lei
Complementar 87, no que se refere aos produtos agropecuários, autorizou, de
forma plena, o creditamento do imposto cobrado nas operações anteriores às
isentas com o imposto devido nas operações subsequentes. Em relação a outras
mercadorias, a autorização depende da previsão em lei estadual (artigo 20,
parágrafo 6º, II, da LC 87).
Ilegalidade do RICMS
O ministro relator entendeu que, embora o artigo
155, parágrafo 2º, da Constituição tenha utilizado a expressão legislação, não
se pode esquecer que o artigo 155, parágrafo 2º, XII, c, da Constituição dispõe
que cabe à lei complementar disciplinar o regime de compensação do ICMS.
A LC 87, em harmonia com a Constituição, assegura o
direito à compensação levando em consideração o imposto devido em cada
operação, na qual haja circulação de mercadoria ou prestação de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, sem impor que a
operação antecedente refira-se a uma determinada mercadoria ou serviço.
O ministro Mauro Campbell Marques concluiu que, se
o legislador complementar federal não impôs restrição ao aproveitamento dos
créditos relativos aos produtos agropecuários, essa restrição não pode ser
fixada por regulamento estadual. Ao dispor assim, o regulamento estadual inovou
o ordenamento jurídico, deixando de observar, inclusive, o artigo 99 do Código
Tributário Nacional, concluiu o relator.
Acrescentou, ainda, que verificar se um regulamento
extrapola ou não o conteúdo da lei não implica usurpação da competência do
Supremo Tribunal Federal. Sobre esse ponto, o ministro Castro Meira ressaltou
que “evidentemente essa matéria não é constitucional; é uma matéria
infraconstitucional, genuinamente infraconstitucional”.
Processo relacionado: REsp 897513
Fonte: Superior Tribunal de Justiça
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