O que o Direito Societário e o Direito de Família têm em comum, a ponto de me despertar a mesma sensação?
Notícia publicada na edição de 03/08/2012 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 2 do caderno A - o conteúdo da edição impressa na internet é atualizado diariamente após as 12h.
* Gustavo Henrique Coimbra Campanati
Minha formação acadêmica e profissional sempre derivou para o Direito Empresarial. Não sei bem ao certo o que me levou por tais caminhos: se foram minhas experiências pessoais, desde bem jovem, ou se foram os excelentes professores que tive nesta área. O motivo não importa. Importa apenas dizer: o tema sempre me despertou interesse e curiosidade, com especial gosto pelo Direito Societário.
Com o passar dos anos, vi-me também, muitas vezes, envolvido em questões de Direito de Família, percebendo em mim o mesmo fascínio por essa área. Mas, por que lhe conto minhas ""intimidades"", caro leitor, neste espaço dos advogados, caso esteja se perguntando? Escrevo para compartilhar uma óbvia conclusão que me assaltou dia desses. É tão simples que agora soa pueril. Mas, por (muitas) vezes, e realmente é clichê dizer isso, não percebemos o que está bem à nossa frente.
A pergunta: O que o Direito Societário e o Direito de Família têm em comum, a ponto de me despertar a mesma sensação? A resposta: Óbvio, ambos tratam das relações interpessoais! Tratam do nascimento e, por vezes, do fim de uma sociedade. Uma empresarial, outra conjugal. Mas, ainda assim, o que isso tem de relevante para estar sendo escrito (e lido) nesta coluna? Explico: É que, a partir desta singela premissa, posso compartilhar algumas conclusões a que cheguei nesta década e pouco de ""causos"".
Pois bem, ninguém (normal) se associa empresarialmente a alguém para dissolver a sociedade; da mesma maneira, duas pessoas não se unem, premeditadamente, para se separarem! Os sonhos iniciais são absolutamente os mesmos, guardadas as diferenças de cada espécie: - ""Nossa família vai ser feliz e prosperar"", pensa o casal. - ""Nosso negócio vai ser bom e prosperar"", pensam os empresários. E não poderia ser diferente, pois o ser humano intrinsecamente busca ser feliz e realizado - mesmo que, em ambos os casos, alguns pendam, involuntariamente, para a (auto) destrutividade.
O Direito Societário há muito criou formas e modelos de associação empresarial entre pessoas, prescrevendo uma maneira objetiva de solução de conflitos, ainda que nem sempre as soluções se mostrem eficazes ou práticas, como poderemos debater noutra oportunidade. A título de exemplo, já em 1919, a legislação comercial da sociedade limitada permitia a saída da sociedade, do sócio que divergisse da alteração do contrato social (art. 15 do Decreto 3.708).
Por sua vez, o Direito de Família, compreensivelmente mais arraigado às questões socioculturais e religiosas, andou a passos bem mais lentos. Basta citar que o divórcio foi admitido no Brasil apenas em 1977, uma vez que, desde a Constituição de 1934, tínhamos que ""a família, constituída pelo casamento indissolúvel, se encontra sob a proteção direta do Estado"" (art. 144). Apenas com a Emenda da Constituição nº 66, de 2010(!), passou-se a permitir a dissolução do casamento pelo divórcio, sem a antecedência de prazos ou condições prévias (separação judicial).
Mas, se demorou tanto para chegarmos a este estágio no Direito de Família, vale refletir sobre o porquê da demora e da mudança. A meu ver, se a demora se explica facilmente pelo já mencionado acima (fatores sociais, culturais e religiosos), não é tão simples falar do motivo da mudança de entendimento do legislador. De um lado, temos a tendência de seguir na direção da menor intervenção do Estado na vida privada, e de outro, temos que ponderar sobre o que já designado por psicólogas estudiosas do tema, de Divórcio-Destrutivo.
Nas relações empresariais, falando de forma genérica, a falta de boa relação entre os sócios (quebra da affectio societatis) é, na maioria das vezes, motivo suficiente para a resolução da sociedade para o sócio que se retira. É bem verdade que a solução das questões patrimoniais pode se arrastar por anos, mas o ""divórcio"" da sociedade se dá.
Nas relações familiares, a vontade do cônjuge que busca o fim do casamento também deve prevalecer e subsistir em si mesma. As questões correlatas, como, guarda e visita de filhos menores, eventuais pensões, partilha de bens, etc., precisarão ser resolvidas, mas o vínculo jurídico deve ser extinto desde logo, ""apenas"" porque este é o desejo de alguém. Busca-se assim evitar ou, ao menos, mitigar o Divórcio-Destrutivo, em que o cônjuge necessita ganhar o processo a qualquer custo, simplesmente pela tentativa de desvalorizar/desqualificar o outro. São os casos em que os cônjuges medem forças no contexto judicial, muitas vezes distorcendo a realidade, os fatos e as provas, em busca da ""vitória"".
Quando há filhos menores no Divórcio-Destrutivo, muitas vezes o cônjuge usa os filhos como arma para atingir o outro genitor. Pode haver (e geralmente há) a dificuldade do cônjuge em diferenciar e separar o papel de pai/mãe do papel conjugal e o rancor conjugal, criado com o fim do matrimônio, acaba superando o interesse no bem-estar dos filhos. Aos advogados cabe, uma vez verificada a intenção firme do fim da sociedade, buscar a solução jurídica menos traumática para todos os envolvidos, em especial para os menores, utilizando o processo como meio de solução de conflitos e não como gerador deles.
* Gustavo Henrique Coimbra Campanati é advogado e presidente da comissão de sociedades de advogados da OAB Sorocaba - vicepresidencia@oabsorocaba.org.br
Minha formação acadêmica e profissional sempre derivou para o Direito Empresarial. Não sei bem ao certo o que me levou por tais caminhos: se foram minhas experiências pessoais, desde bem jovem, ou se foram os excelentes professores que tive nesta área. O motivo não importa. Importa apenas dizer: o tema sempre me despertou interesse e curiosidade, com especial gosto pelo Direito Societário.
Com o passar dos anos, vi-me também, muitas vezes, envolvido em questões de Direito de Família, percebendo em mim o mesmo fascínio por essa área. Mas, por que lhe conto minhas ""intimidades"", caro leitor, neste espaço dos advogados, caso esteja se perguntando? Escrevo para compartilhar uma óbvia conclusão que me assaltou dia desses. É tão simples que agora soa pueril. Mas, por (muitas) vezes, e realmente é clichê dizer isso, não percebemos o que está bem à nossa frente.
A pergunta: O que o Direito Societário e o Direito de Família têm em comum, a ponto de me despertar a mesma sensação? A resposta: Óbvio, ambos tratam das relações interpessoais! Tratam do nascimento e, por vezes, do fim de uma sociedade. Uma empresarial, outra conjugal. Mas, ainda assim, o que isso tem de relevante para estar sendo escrito (e lido) nesta coluna? Explico: É que, a partir desta singela premissa, posso compartilhar algumas conclusões a que cheguei nesta década e pouco de ""causos"".
Pois bem, ninguém (normal) se associa empresarialmente a alguém para dissolver a sociedade; da mesma maneira, duas pessoas não se unem, premeditadamente, para se separarem! Os sonhos iniciais são absolutamente os mesmos, guardadas as diferenças de cada espécie: - ""Nossa família vai ser feliz e prosperar"", pensa o casal. - ""Nosso negócio vai ser bom e prosperar"", pensam os empresários. E não poderia ser diferente, pois o ser humano intrinsecamente busca ser feliz e realizado - mesmo que, em ambos os casos, alguns pendam, involuntariamente, para a (auto) destrutividade.
O Direito Societário há muito criou formas e modelos de associação empresarial entre pessoas, prescrevendo uma maneira objetiva de solução de conflitos, ainda que nem sempre as soluções se mostrem eficazes ou práticas, como poderemos debater noutra oportunidade. A título de exemplo, já em 1919, a legislação comercial da sociedade limitada permitia a saída da sociedade, do sócio que divergisse da alteração do contrato social (art. 15 do Decreto 3.708).
Por sua vez, o Direito de Família, compreensivelmente mais arraigado às questões socioculturais e religiosas, andou a passos bem mais lentos. Basta citar que o divórcio foi admitido no Brasil apenas em 1977, uma vez que, desde a Constituição de 1934, tínhamos que ""a família, constituída pelo casamento indissolúvel, se encontra sob a proteção direta do Estado"" (art. 144). Apenas com a Emenda da Constituição nº 66, de 2010(!), passou-se a permitir a dissolução do casamento pelo divórcio, sem a antecedência de prazos ou condições prévias (separação judicial).
Mas, se demorou tanto para chegarmos a este estágio no Direito de Família, vale refletir sobre o porquê da demora e da mudança. A meu ver, se a demora se explica facilmente pelo já mencionado acima (fatores sociais, culturais e religiosos), não é tão simples falar do motivo da mudança de entendimento do legislador. De um lado, temos a tendência de seguir na direção da menor intervenção do Estado na vida privada, e de outro, temos que ponderar sobre o que já designado por psicólogas estudiosas do tema, de Divórcio-Destrutivo.
Nas relações empresariais, falando de forma genérica, a falta de boa relação entre os sócios (quebra da affectio societatis) é, na maioria das vezes, motivo suficiente para a resolução da sociedade para o sócio que se retira. É bem verdade que a solução das questões patrimoniais pode se arrastar por anos, mas o ""divórcio"" da sociedade se dá.
Nas relações familiares, a vontade do cônjuge que busca o fim do casamento também deve prevalecer e subsistir em si mesma. As questões correlatas, como, guarda e visita de filhos menores, eventuais pensões, partilha de bens, etc., precisarão ser resolvidas, mas o vínculo jurídico deve ser extinto desde logo, ""apenas"" porque este é o desejo de alguém. Busca-se assim evitar ou, ao menos, mitigar o Divórcio-Destrutivo, em que o cônjuge necessita ganhar o processo a qualquer custo, simplesmente pela tentativa de desvalorizar/desqualificar o outro. São os casos em que os cônjuges medem forças no contexto judicial, muitas vezes distorcendo a realidade, os fatos e as provas, em busca da ""vitória"".
Quando há filhos menores no Divórcio-Destrutivo, muitas vezes o cônjuge usa os filhos como arma para atingir o outro genitor. Pode haver (e geralmente há) a dificuldade do cônjuge em diferenciar e separar o papel de pai/mãe do papel conjugal e o rancor conjugal, criado com o fim do matrimônio, acaba superando o interesse no bem-estar dos filhos. Aos advogados cabe, uma vez verificada a intenção firme do fim da sociedade, buscar a solução jurídica menos traumática para todos os envolvidos, em especial para os menores, utilizando o processo como meio de solução de conflitos e não como gerador deles.
* Gustavo Henrique Coimbra Campanati é advogado e presidente da comissão de sociedades de advogados da OAB Sorocaba - vicepresidencia@oabsorocaba.org.br
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